Saber Sofrer
“Porque melhor é que padeçais fazendo o bem (se a vontade de Deus assim o quer) do que fazendo o mal.”
– Pedro (I Pedro, 3:17.)
Em sua primeira epístola, o apóstolo Pedro ensina que devemos aceitar
as provações e ir ao encontro do sentido verdadeiro do pensamento
de Jesus sobre as dores terrenas.
As provações não são nada diante das
bênçãos que conquistamos, ao vencermos com coragem e abnegação as provas
que amealhamos, seguros de que a Terra é apenas um repositório
de experiências necessárias para a evolução do Espírito.
Nossa passagem pela vida corporal é extremamente importante para que possamos cumprir os desígnios de Deus, por meio de ações materiais que nos auxiliam no desenvolvimento da inteligência e da moral.
No entanto,
em todos os atos que realizamos, precisamos considerar que não
pertencemos a este mundo e que, algum dia, retornaremos à
verdadeira pátria espiritual.
Certas pessoas, que não conhecem os princípios básicos do
Espiritismo, não conseguiriam entender ou aceitar os objetivos
abençoados que nos movem na busca de melhoria espiritual.
Porém, falar
do sofrimento como instrumento providencial para edificação e
amadurecimento moral do Espírito é tarefa difícil, mesmo para
nós espíritas que, apesar de termos a compreensão exata dessa
definição, ainda não a aceitamos, como grave desafio a superar em nossa
existência.
Para a mentora espiritual Joanna de Ângelis, o sofrimento se
apresenta como uma enfermidade, e ela aconselha que se faça um
“tratamento conveniente, em que se invistam todos os valores ao
alcance, pela primazia de lograr-se o bem-estar e o equilíbrio
fisiopsíquico”.1
Entretanto, para alguns, o sofrimento não
acaba facilmente.
Soror Joanna de Ângelis alertando-nos para a
necessidade de buscarmos a sua cessação afirma:-
- Encontrado o sofrimento,
o homem tem o dever de idenidentificar as suas causas, que procedem dos
atos degenerativos, próximos ou remotos, referente às suas
reencarnações.
Ao lado daqueles que ressumam das dívidas cármicas, estão
os decorrentes das suas emoções desequilibradas, que têm nascentes no
egoísmo, no apego, na imaturidade psicológica.
Dentre outros,
apresentam-se em plano de destaque o medo, o ciúme, a ira, que
explodem facilmente engendrando o sofrimento.1
No uso de nossa relativa liberdade, podemos fazer coisas que afrontam
as leis divinas.
Agimos em oposição ao Criador, sem nos
preocuparmos com as consequências.
Daí resulta o afastamento das boas
ações cujo efeito é a dor, e ela só cessará quando chegarmos à conclusão
de que precisamos mudar, principalmente quanto à nossa
vontade personalista, que insiste em prevalecer em muitas
ocasiões, mesmo sem ter razão.
Allan Kardec, em nota à questão 933, de O
Livro dos Espíritos, reflete sobre as diferenças existentes entre as
criaturas e os resultados obtidos por elas de felicidade e de
infelicidade:-
- De ordinário, o homem só é infeliz pela importância que liga às
coisas deste mundo.
Fazemlhe a infelicidade a vaidade, a ambição e a
cobiça desiludidas.
Se se colocar fora do círculo acanhado da vida
material, se elevar seus pensamentos para o infinito, que é seu destino,
mesquinhas e pueris lhe parecerão as vicissitudes da humanidade, como o
são as tristezas da criança que se aflige pela perda de um brinquedo,
que resumia a sua felicidade suprema.
Aquele que só vê felicidade na
satisfação do orgulho e dos apetites grosseiros é infeliz, desde que não
os pode satisfazer, ao passo que aquele que nada pede ao supérfluo é
feliz com os que outros consideram calamidades.
[…] Como civilizado, o homem raciocina sobre a sua infelicidade e a
analisa.
Por isso é que esta mais o fere, mas, também, lhe é facultado
raciocinar sobre os meios de obter consolação e de analisá-los.
Essa
consolação ele a encontra no sentimento cristão, que lhe dá a esperança
de melhor futuro, e no Espiritismo, que lhe dá a certeza desse futuro.2
Assim, os sofrimentos existem, em forma de tormento material, para os
que não acreditam em Deus, deixando-se transtornar pelas agonias das
vicissitudes, sem suportar as misérias da existência.
Alguns desses
infelizes indivíduos procuram, no suicídio, a pretensa solução para seus
males.
Igualmente, o sofrimento cresce para aqueles em que “o orgulho
ferido, a ambição frustrada, a ansiedade da avareza, a inveja, o ciúme,
todas as paixões […] são torturas da alma.[…]
O invejoso e o ciumento
vivem ardendo em contínua febre […]”.2
São os que criam
suplícios voluntários para si.
Por outro lado, os sofrimentos surgem também para aqueles que se
tornam verdadeiramente fortes e resolutos para enfrentá-los, com a
crença a sustentá-los na dolorosa caminhada terrena.
Testemunhos acerbos
são vividos por essas almas bondosas e humildes, que aceitam com
paciência e abnegação suas penas temporárias.
São Espíritos que
reencarnam em condições de vencer suas mazelas morais, sem se deixarem
abater pela excessiva tristeza, convictos de que, em pouco tempo,
haverão de se libertar dos problemas materiais e morais que os atingem,
continuando seu itinerário de luz em benefício dos homens.
É
difícil imaginar como essas pessoas conseguem suplantar suas
desmedidas dores, construindo um clima de paz e benemerência à sua
volta, tornando-se modelos singulares para nós.
O Dr. Viktor Emil Frankl (1905-1997) – M. D. ph.D., professor de Neurologia e Psiquiatria da Universidade
de Viena e da Universidade Internacional da Califórnia, criador da
Logoterapia, autor de dezenas de livros e reconhecido mundialmente –
legou à Humanidade exemplos edificantes sobre a sua vida.
Foi
prisioneiro dos nazistas em campos de concentração – entre eles o
de Auschwitz – sendo reduzido a uma vida extremamente dolorosa e
miserável, até ser libertado.
Seus pais, seu irmão e sua esposa foram
mortos em outros campos de extermínio.
Ele resistiu bravamente a
essa desafiadora prova, que lhe fazia sentir, diariamente, as
angústias de esperar a cada momento por sua exterminação, além
da saudade pungente que guardava de seus afetos.
Em seus trabalhos
terapêuticos, um dos argumentos essenciais defendidos por ele é
descobrir o sentido da vida e do sofrimento:-
[…] Um dos principais fundamentos da logoterapia está em que a
principal preocupação da pessoa não consiste em obter prazer ou evitar a
dor, mas antes em ver um sentido em sua vida.
Essa a razão por que o ser humano está pronto até a sofrer, sob a condição, é claro, de que seu sofrimento tenha um sentido.
É preciso deixar perfeitamente claro […], que o sofrimento não é de modo algum necessário para encontrar sentido.
Insisto apenas que o sentido é possível mesmo a despeito do sofrimento – desde que, naturalmente, o sofrimento seja inevitável.
Se ele fosse evitável, no entanto, a coisa significativa a fazer seria eliminar sua causa, fosse ela psicológica, biológica ou política.
Sofrer desnecessariamente é ser masoquista, e não heroico.
[…] Ao aceitar esse desafio de sofrer com bravura, a vida recebe um sentido até seu derradeiro instante, mantendo esse sentido literalmente até o fim.
Em outras palavras, o sentido da vida é um sentido incondicional, por incluir até o sentido potencial do sofrimento inevitável.3
A fé em Deus permitiu que esse homem extraordinário ajudasse outras pessoas sofridas, após as experiências trágicas, ocorridas durante a Segunda Guerra Mundial.
Soube tirar proveito das lições que recebeu, sem se sentir completamente derrotado nas lutas enfrentadas pela sua sobrevivência.
Aceitou o desafio de sofrer corajosamente e encontrou um verdadeiro sentido em sua vida ao tentar compreender, profundamente, as razões do sofrimento para si e para milhares de seres humanos.
Para determinados espíritas, como já vimos anteriormente, o sofrimento surge, muitas vezes, pela incúria e pela imperfeição, resultando em experiências dolorosas a exprimir os erros do passado e do presente.
Porém, os resgates, promulgados pelas leis divinas, conferem-nos inúmeras oportunidades espirituais que conquistamos, obtendo a cura de nossas doenças morais.
Em página psicografada por Francisco Cândido Xavier, o Espírito Emmanuel pergunta a respeito de como tem sido nosso empenho no serviço a executar em benefício daqueles que sofrem:-
- Como recear o cansaço e o esgotamento, as complicações e incompreensões, os conflitos e os desgostos decorrentes da abençoada luta pela suprema vitória do bem, se o combate pelo triunfo provisório do mal conduz os batalhadores a tributos aflitivos de sofrimento?
Gastemos nossas melhores possibilidades a serviço do Cristo, empenhando-lhe nossas vidas.
A arma criminosa que se quebra e a medida repugnante consumada provocam sempre maldição e sombra, mas para o servo dilacerado no dever e para a lâmpada que se apaga no serviço iluminativo reserva-se destino diferente.4
Desse modo, é preciso amadurecer emocionalmente, admitir que o sofrimento nos depura todas as vezes que procurarmos, no trabalho de Jesus, olvidar os dramas vividos em nossas existências.
A dor amiga nos convida a servir ao próximo, e o ato de doação se transforma no melhor remédio para os que sofrem.
Na Terra, sofrem todos, quer sejam ricos ou pobres.
No entanto, poucos sofrem bem e aceitam suas provas com compreensão e paciência.
Deus não coloca fardos pesados em ombros fracos e se torna primordial acreditar na bondade divina:-
- […] O fardo é proporcionado às forças, como a recompensa o será à resignação e à coragem.
Mais opulenta será a recompensa, do que penosa a aflição.
Cumpre, porém, merecê-la, e é para isso que a vida se apresenta cheia de tribulações.5
REFERÊNCIAS:-
1 FRANCO, Divaldo Pereira. O homem integral. Pelo Espírito Joanna de Ângelis. Salvador (BA): Leal Editora, 1990. cap. Os sofrimentos humanos, p. 127, 128, respectivamente.
2 KARDEC, Allan. O livro dos espíritos. Trad. Guillon Ribeiro. 93. ed. 1. imp. (Edição Histórica.) Brasília: FEB, 2013. Comentário de Kardec à questão 933.
3 FRANKL, Viktor. Em busca do sentido: um psicólogo no campo de concentração. Trad. Walter O. Schlupp e Carlos
C. Aveline. 32. ed. revisada. São Leopoldo: Editora Sinodal; Petrópolis: Editora Vozes, 2008. “O sentido do sofrimento”, p. 137-138.
4 XAVIER, Francisco C. Pão nosso. Pelo Espírito Emmanuel. 9. imp. Brasília: FEB, 2015. cap. 64.
5 KARDEC, Allan. O evangelho segundo o espiritismo. Trad. Guillon Ribeiro. 131. ed. 6. imp. (Edição Histórica.)
Brasília: FEB, 2015. cap, 5, it. Bem e mal sofrer..
Essa a razão por que o ser humano está pronto até a sofrer, sob a condição, é claro, de que seu sofrimento tenha um sentido.
É preciso deixar perfeitamente claro […], que o sofrimento não é de modo algum necessário para encontrar sentido.
Insisto apenas que o sentido é possível mesmo a despeito do sofrimento – desde que, naturalmente, o sofrimento seja inevitável.
Se ele fosse evitável, no entanto, a coisa significativa a fazer seria eliminar sua causa, fosse ela psicológica, biológica ou política.
Sofrer desnecessariamente é ser masoquista, e não heroico.
[…] Ao aceitar esse desafio de sofrer com bravura, a vida recebe um sentido até seu derradeiro instante, mantendo esse sentido literalmente até o fim.
Em outras palavras, o sentido da vida é um sentido incondicional, por incluir até o sentido potencial do sofrimento inevitável.3
A fé em Deus permitiu que esse homem extraordinário ajudasse outras pessoas sofridas, após as experiências trágicas, ocorridas durante a Segunda Guerra Mundial.
Soube tirar proveito das lições que recebeu, sem se sentir completamente derrotado nas lutas enfrentadas pela sua sobrevivência.
Aceitou o desafio de sofrer corajosamente e encontrou um verdadeiro sentido em sua vida ao tentar compreender, profundamente, as razões do sofrimento para si e para milhares de seres humanos.
Para determinados espíritas, como já vimos anteriormente, o sofrimento surge, muitas vezes, pela incúria e pela imperfeição, resultando em experiências dolorosas a exprimir os erros do passado e do presente.
Porém, os resgates, promulgados pelas leis divinas, conferem-nos inúmeras oportunidades espirituais que conquistamos, obtendo a cura de nossas doenças morais.
Em página psicografada por Francisco Cândido Xavier, o Espírito Emmanuel pergunta a respeito de como tem sido nosso empenho no serviço a executar em benefício daqueles que sofrem:-
- Como recear o cansaço e o esgotamento, as complicações e incompreensões, os conflitos e os desgostos decorrentes da abençoada luta pela suprema vitória do bem, se o combate pelo triunfo provisório do mal conduz os batalhadores a tributos aflitivos de sofrimento?
Gastemos nossas melhores possibilidades a serviço do Cristo, empenhando-lhe nossas vidas.
A arma criminosa que se quebra e a medida repugnante consumada provocam sempre maldição e sombra, mas para o servo dilacerado no dever e para a lâmpada que se apaga no serviço iluminativo reserva-se destino diferente.4
Desse modo, é preciso amadurecer emocionalmente, admitir que o sofrimento nos depura todas as vezes que procurarmos, no trabalho de Jesus, olvidar os dramas vividos em nossas existências.
A dor amiga nos convida a servir ao próximo, e o ato de doação se transforma no melhor remédio para os que sofrem.
Na Terra, sofrem todos, quer sejam ricos ou pobres.
No entanto, poucos sofrem bem e aceitam suas provas com compreensão e paciência.
Deus não coloca fardos pesados em ombros fracos e se torna primordial acreditar na bondade divina:-
- […] O fardo é proporcionado às forças, como a recompensa o será à resignação e à coragem.
Mais opulenta será a recompensa, do que penosa a aflição.
Cumpre, porém, merecê-la, e é para isso que a vida se apresenta cheia de tribulações.5
REFERÊNCIAS:-
1 FRANCO, Divaldo Pereira. O homem integral. Pelo Espírito Joanna de Ângelis. Salvador (BA): Leal Editora, 1990. cap. Os sofrimentos humanos, p. 127, 128, respectivamente.
2 KARDEC, Allan. O livro dos espíritos. Trad. Guillon Ribeiro. 93. ed. 1. imp. (Edição Histórica.) Brasília: FEB, 2013. Comentário de Kardec à questão 933.
3 FRANKL, Viktor. Em busca do sentido: um psicólogo no campo de concentração. Trad. Walter O. Schlupp e Carlos
C. Aveline. 32. ed. revisada. São Leopoldo: Editora Sinodal; Petrópolis: Editora Vozes, 2008. “O sentido do sofrimento”, p. 137-138.
4 XAVIER, Francisco C. Pão nosso. Pelo Espírito Emmanuel. 9. imp. Brasília: FEB, 2015. cap. 64.
5 KARDEC, Allan. O evangelho segundo o espiritismo. Trad. Guillon Ribeiro. 131. ed. 6. imp. (Edição Histórica.)
Brasília: FEB, 2015. cap, 5, it. Bem e mal sofrer..
Saber Sofrer
Clara Lila Gonzalez de Araújo claralilaez@gmail.com
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