Médicos incluem Espiritualidade em seus Tratamentos
Revista Isto É
Há uma revolução em curso na
medicina que mudará para sempre a forma de tratar o paciente.
Médicos e
instituições hospitalares do mundo todo começam a incluir nas suas
rotinas de maneira sistemática e definitiva a prática de estimular nos
pacientes o fortalecimento da esperança, do otimismo, do bom humor e da
espiritualidade.
O objetivo é simples:-
- Despertar ou fortificar nos indivíduos condições emocionais positivas,
já abalizadas pela ciência como recursos eficazes no combate a doenças.
Esses elementos funcionariam, na verdade, como remédios para a alma –
mas com repercussões benéficas para o corpo.
No Brasil, a nova postura
faz parte do cotidiano de instituições do porte do Instituto do Coração
(InCor), em São Paulo, da Rede Sarah Kubitschek e do Instituto Nacional
de Traumatologia e Ortopedia (Into), no Rio de Janeiro, três referências
nacionais na área de reabilitação física.
Nos Estados Unidos, o
conceito integra a filosofia de trabalho, entre outros centros, do
Instituto Nacional do Câncer, um dos mais importantes pólos de pesquisa
sobre a enfermidade do planeta, e da renomada Clínica Mayo, conhecida
por estudos de grande repercussão e tratamentos de primeira linha.
A adoção desta postura teve origem primeiro na constatação empírica de que atitudes mais positivas traziam benefício aos pacientes.
Isso começou a ser observado principalmente em centros de tratamento de
doenças graves como câncer e males que exigem do indivíduo uma força
monumental.
No dia-a-dia, os médicos percebiam que os doentes apoiados
em algum tipo de fé e que mantinham a esperança na recuperação de fato
apresentavam melhores prognósticos.
A partir daí, pesquisadores ligados
principalmente a essas instituições iniciaram estudos sobre o tema.
Hoje há dezenas deles.
Um exemplo é um trabalho publicado na
edição da revista científica BMC Câncer sugerindo que ""o otimismo é um
fator de proteção contra o câncer de mama. ""
“Verificamos que mulheres
expostas a eventos negativos têm mais risco de contrair a doença do que
aquelas que apresentam maiores sentimentos de felicidade e positivismo”,
explicou Ronit Peled, da Universidade de Neguev, de Israel, autor da
pesquisa.
Na última edição do Annals of Family Medicine – publicação de
várias sociedades científicas voltadas ao estudo de medicina da família –
há outra mostra do que vem sendo obtido.
Uma pesquisa divulgada na
revista revelou que homens otimistas em relação à própria saúde de
alguma forma ficaram mais protegidos de doenças cardiovasculares.
Os
cientistas acompanharam 2,8 mil voluntários durante 15 anos.
Eles
constataram que a incidência de morte por infarto ou acidente vascular
cerebral foi três vezes menor entre aqueles que no início estavam mais
confiantes em manter uma boa condição física.
Provas dos efeitos da
adoção da espiritualidade na melhora da saúde também começaram a surgir.
Nos estudos sobre o tema, a prática aparece associada à redução da
ansiedade, da depressão e à diminuição da dor, entre outras
repercussões.
A partir de informações como essas, os cientistas resolveram identificar o que levava a esse impacto.
Chegaram basicamente a duas
razões.
Uma é de natureza comportamental.
Em geral, quem é otimista, tem
esperança e cultiva alguma fé costuma ter hábitos mais saudáveis.
Além
disso, essas pessoas seguem melhor o tratamento. “Uma postura positiva
leva a gestos positivos.
Os pacientes se cuidam mais, alimentam-se bem,
fazem direito a fisioterapia, mesmo que ela seja dolorosa”, explica a
clínica geral carioca Cláudia Coutinho.
A outra explicação tem fundamento biológico.
A outra explicação tem fundamento biológico.
Está provado que a
manutenção de um estado de espírito mais seguro e esperançoso
desencadeia no organismo uma cadeia de reações que só trazem o bem.
“Se o
paciente é otimista, encara um problema de saúde como um desafio a ser
vencido.
Nesse caso, as alterações ocorridas no corpo poderão ser usadas
a seu favor”, explica o pesquisador Ricardo Monezi, do Instituto de
Medicina Comportamental da Universidade Federal de São Paulo.
O bom
humor, por exemplo, é capaz de promover o aumento da produção de
hormônios que fortalecem o sistema de defesa, fundamental quando o corpo
precisa lutar contra inimigos.
Além disso, o riso provoca relaxamento
de vários grupos musculares, melhora as funções cardíacas e
respiratórias e aumenta a oxigenação dos tecidos.
É esse arcabouço de informações que permite hoje o uso, na prática, da espiritualidade, do otimismo, da esperança e do bom humor como recursos terapêuticos dentro da medicina.
É esse arcabouço de informações que permite hoje o uso, na prática, da espiritualidade, do otimismo, da esperança e do bom humor como recursos terapêuticos dentro da medicina.
Nos Estados Unidos, por
exemplo, pesquisadores da Universidade do Alabama preparam-se para
começar a aplicar um tratamento batizado de “terapia da esperança”.
O
sistema consiste em ajudar os pacientes a construir e a manter a
esperança diante da doença.
“O primeiro passo é auxiliá-los a encontrar
um objetivo importante que dê sentido a suas vidas.
Depois, aumentar a
motivação para alcançá-lo e orientá-los sobre os caminhos a serem
seguidos”, explicou à ISTOÉ Jennifer Cheavens, da Universidade de Ohio e
participante do grupo que desenvolveu a novidade.
Desde que recebeu o diagnóstico de câncer no intestino, no ano
passado, a consultora de marketing carioca decidiu que manter o bom
humor seria sua grande arma.
“Claro que em alguns momentos eu fiquei
triste.
Mas resolvi que não me deixaria abater e que continuaria a rir
muito”, lembra ela, autora do Livro Câncer:-
- Sentença ou Renovação?
Essa construção é feita com base em técnicas usadas na terapia cognitivo-comportamental, cujo objetivo é treinar o indivíduo a pensar e a agir de forma diferente para conseguir lidar de modo mais eficiente diante de condições adversas.
Essa construção é feita com base em técnicas usadas na terapia cognitivo-comportamental, cujo objetivo é treinar o indivíduo a pensar e a agir de forma diferente para conseguir lidar de modo mais eficiente diante de condições adversas.
O treinamento é feito com duas sessões
semanais realizadas durante dois meses.
A terapia será usada em
portadores de deficiências visuais e nas pessoas responsáveis por seus
cuidados.
“Acreditamos que ela ajudará muito na redução da depressão e
de outros problemas associados à perda da visão.
Os pacientes ficarão
mais motivados a lutar contra as dificuldades e a participar dos
trabalhos de reabilitação”, explicou à ISTOÉ Laura Dreer, professora do
departamento de oftalmologia da Universidade do Alabama, nos EUA.
No Brasil, a inclusão da ferramenta na prática médica está mudando
a rotina dos hospitais.
No Instituto de Ortopedia, no Rio de Janeiro,
por exemplo, o trabalho médico é acompanhado pelo suporte psicológico,
dedicado especialmente a fortalecer uma atitude mais positiva.
O
trabalho, claro, não é simples.
Os pacientes costumam ser vítimas de
traumas medulares ocorridos em situações como acidentes ou quedas.
De
uma hora para outra, têm a vida totalmente limitada.
“Por isso,
precisamos ajudá-los a enfrentar a nova situação.
Eles têm de passar por
uma reabilitação física e emocional”, explica a psicóloga Fátima Alves,
responsável pelo grupo.
E quem faz isso usando o otimismo e a esperança
como armas sai ganhando.
“Mostramos principalmente aos mais descrentes
que a postura positiva no enfrentamento da doença é um remédio”, afirma
Tito Rocha, coordenador da unidade hospitalar do instituto.
Em breve,
eles abrirão um grupo para incentivar o cultivo da espiritualidade pelos
doentes.
Talvez o símbolo mais emblemático do fim do preconceito da medicina ocidental contra questões relativas à emoções e espiritualidade seja o que está acontecendo na Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP), a mais tradicional do País.
A instituição sediou um
evento para mostrar aos profissionais de saúde a importância de recursos
como a espiritualidade e o bom humor na recuperação de pacientes.
O
curso foi ministrado pelo geriatra Franklin dos Santos, professor de
pós-graduação da disciplina de emergências médicas da universidade.
No
programa, houve um bom espaço para ensinar os médicos e enfermeiros a
usarem essas ferramentas.
“Discutimos como isso deve ser aplicado na
prática”, diz o médico, que tem dado palestras pelas escolas de medicina
do País inteiro.
Nos Estados Unidos, também há um esforço para treinar os profissionais de saúde.
Nos Estados Unidos, também há um esforço para treinar os profissionais de saúde.
Só para se ter uma idéia, o Instituto Nacional
de Câncer americano criou uma espécie de guia para orientar médicos,
enfermeiros e psicólogos sobre como usar a espiritualidade do paciente a
seu favor.
Todo esse interesse é o sinal mais patente de que a
revolução vai durar.
Por isso, ninguém deve se surpreender se quando
chegar ao consultório médico for indagado sobre suas condições de saúde,
obviamente, mas também sobre sua relação com a espiritualidade ou
disposição de esperança.
“Questões como essas devem começar a ser cada vez mais levantadas”, defende Brick Johnstone, professor de psicologia médica da Universidade Missouri-Columbia, nos EUA.
“Questões como essas devem começar a ser cada vez mais levantadas”, defende Brick Johnstone, professor de psicologia médica da Universidade Missouri-Columbia, nos EUA.
FONTE: REVISTA ISTO É
EDIÇÃO 2025
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